sábado, 15 de dezembro de 2007

ROSAS A TODOS

Um amigo pergunta o que leva alguém a manter um blogue. Para começar, a vaidade. Como o aspartame, ela está presente em tudo, de forma oculta ou explícita.

Porém, no meu caso, a razão principal é outra. Delicio-me até hoje com a possibilidade de publicar por conta própria, de forma instantânea. Na época em que escrevia livros, vi meus originais amargarem longos anos de gaveta. Nunca me foi fácil conseguir editores, que de resto se revelaram mais adversários do que aliados nessa empreitada tortuosa, talvez insana, de levar um texto aos olhos do leitor.

Num blogue, é vapt-vupt. Não sou um blogueiro comme il faut, que interage com os leitores e bota lenha na fogueira. Gostaria de sê-lo, porém mal tenho tempo para perpetrar estas crônicas quinzenais. Espanta-me constatar que já produzi 54, contando com esta.

A propósito de uma outra, Morin e a China, publicada em outubro, Geraldo Hasse me cobrava: “Acho bom tu explicares melhor o que significa a frase 'o individualismo gera dentro de si uma espécie de nostalgia humanitária, e vice-versa”. Ela é mesmo mandrake, admito. Não me agrada turvar as águas do rio para que elas pareçam profundas. Como redator, é cair para a Segundona. Tentarei explicar-me.

Acho que povos e indivíduos, por lucidez ou tédio, se alternam entre fases voltadas para um ideal coletivo ou a uma fixação no próprio umbigo. No primeiro caso, o foco pode ser a justiça social, a sobrevivência ou o esforço para virar uma página da história. No segundo caso, a preocupação com o lucro, os bens materiais e o prazer imediato falam mais alto.

O Oriente vive hoje um delírio consumista, e dane-se o resto. Em contrapartida, entre nós, alguns valores ascéticos e coletivistas da contracultura ressurgem nas pautas das corporações. Em parte por oportunismo, claro, mas também porque o senso comum já sabe aquilo que antes só os hippies sabiam: do jeito que está, a vaca vai pro brejo.

Não creio que essa alternância de sintonia se deva apenas a ameaças globais. Para ela também contribui a provinciana lembrança (real ou fictícia, pouco importa, mas sempre inspiradora) de um tempo em que éramos todos menos cínicos e mais felizes.

Isto posto, o blogue entra em recesso até depois do carnaval. Boa virada de ano a todos. Em 2008 teremos o centenário de Guimarães Rosa. Desde já, muitas rosas a nós todos.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

A ESTRELA ROUBADA

“Aqui se faz, aqui se paga”. Leo Vázquez evoca o velho ditado ao referir-se ao rebaixamento do Corinthians, cujo último título nacional considera espúrio. Insiste em que o Brasileiro de 2005 foi decidido pela soma dos feitos de quatro cavalheiros de alta estirpe que teriam formado, diz Leo, um “quadrado mágico”. Seriam eles: Ricardo Teixeira, caudilho vitalício da CBF, que agraciou o Corinthians com a chance de resgatar pontos que já havia perdido; Kia Joorabchian, o homem da mala, sócio anglo-iraniano da Media Sports Investments (MSI); Alberto Dualib, que dispensa comentários; e o árbitro Márcio Rezende de Freitas, que naquele jogo do Pacaembu, que valia por uma final, não viu o pênalti a favor do Internacional, assim como o presidente da república não via nada do que se passava na sala ao lado até que estourasse o escândalo do “Mensalão”.

Mesmo assim reluto em endossar o ditado evocado por Leo. Tenho grandes amigos corintianos. Não gostaria de estar na pele deles, hoje. Por outro lado, admito, seria hipocrisia de minha parte dizer que sinto muito pelo que aconteceu.

Naquele fatídico 2005, um constrangimento mútuo (no mínimo) se instalou entre corintianos e colorados, torcidas até então mais ou menos fraternas. No último confronto direto, no Pacaembu, há cerca de um mês, na arquibancada lilás os colorados ainda brandiam uma faixa alusiva à “estrela roubada”.

Roubada, também acho que foi. Porém temos de virar a página. O Inter, convenhamos, teve um 2007 quase tão inglório quanto o Corinthians. Após o título mundial no Japão, há um ano, entrou em depressão pós-parto. Ficou em 8º lugar no campeonato gaúcho, seu pior desempenho em quase um século de história; teve participação bisonha na Libertadores; e por fim deu com os burros n’água no Brasileiro, ficando em 11º lugar após dois vice-campeonatos nos anos anteriores. De certo modo, também fomos rebaixados.

A recuperação do Inter, em 2008, pressupõe a superação de um ressentimento. Para conquistar novas estrelas, precisamos esquecer a que nos foi roubada. O Corinthians que faça bom uso dela, nas estradas empoeiradas que vai ter de trilhar até voltar à primeira divisão. Daqui a um ano, estaremos todos com saudades.