quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O PIJAMA AZUL

Meu pijama azul-claro, conhecido como Bento XVII (foi comprado na Rua São Bento num dia 17), é de opinião que devo votar em Serra. Como se isso fosse fácil. O problema da política (e seu fascínio, para alguns) é que se trata de um jogo de xadrez que, às vezes, tem de ser jogado também com o coração. Caso contrário, seria apenas isso: um jogo de xadrez. No primeiro turno, permiti-me um voto romântico, em Plínio, por antever que, em um improvável segundo turno, só me restaria o voto útil, que detesto, sempre detestei, mas não me atrevo a descartar. 

Tento explicar a Bento XVII que é frustrante escolher um candidato por eliminação, e não por opção. Mas ele responde que resignar-se ao menos pior é prova de maturidade. E conjectura: numa imaginária eleição durante o regime militar, eu teria preferido Geisel a Médici. Bem, é verdade. Entre os dois, eu teria votado em Geisel. Inutilmente. Pois ele perderia. Geisel era casmurro como Serra. Médici, popularesco como Lula. Ganharia de qualquer um, de lavada, antes que o "milagre econômico" mostrasse suas aspas. O que Bento XVII quer me dizer, no fundo, é o seguinte: dança-se conforme a música.

Leo Vázquez prefere o silêncio. Acha fanfarronada isso de que os partidos políticos se digladiam por princípios, plataformas, modelos, ideologias etc. Para ele, as duas tribos finalistas da eleição presidencial só representam estilos diferentes de rapinagem. Uma, a rapinagem orgânica. Outra, a rapinagem terceirizada. Leo dispara:

> Além da rapinagem, a classe política brasileira ainda goza de privilégios amazônicos. Não dá para chamar isso de república. É uma monarquia rotativa.

Leo sugere-me anular o voto. Bento rechaça a ideia. E me vem com essa:

> Antes Serra do que tarde.

Bento XVII argumenta: a simples alternância de partidos no poder (ou de estilos rapinagem, como quer Leo) é salutar, a longo prazo, pois ajuda a depurar a o sistema. Hum, tenho dúvidas... Francamente, não sei o que fazer. Nunca antes neste país foi tão difícil vestir um pijama. Durmo pensando no verso de Leminski: Haja hoje para tanto ontem.