sábado, 12 de março de 2011
O LIVRO, OBSOLETO E ETERNO
Tenho a impressão de que no Brasil há mais escritores do que leitores. Isto, claro, se nos permitirmos considerar escritores todos os que escrevem livros, e não apenas os que vivem disso.
O fato de que se leia cada vez menos livros é não só evidente, como inelutável. Esses jovens irrequietos estão em outra. E para seus filhos o livro será tão anacrônico quanto a ampulheta.
Mas o livro não vai desaparecer. O selo não desapareceu. Nem a garrafa. Ambos têm, como o livro, sucedâneos mais cômodos, baratos e eficientes. Espero que ninguém tenha pensado em jantar à luz de velas com vinho em embalagem Tetra Pak. Tirar a rolha é como virar as páginas. Temos nossos rituais.
Ao longo dos séculos, os livros acumularam um valor arquetípico que não pode, em décadas, ser suplantado por tecnologias autofágicas que passam como chuvas de verão. Eles vão desaparecer do cotidiano, como os selos, como o vinho, mas não da vida. Um objeto de papel, com coisas escritas dentro, tem mais presença que um texto na tela, tão volátil como este aqui. Tememos a finitude.
Sim, há um fator psíquico. O ato solitário de escrever um livro propicia (e de graça!) a qualquer um, amador ou profissional, uma ilusória impressão de permanência e até de eternidade, para os mais ambiciosos. Justamente o que falta nessa pletora de artefatos digitais que vemos à nossa volta. Escrevemos um livro e parece que aquilo vai durar mais que nós. Sabemos que não vai, mas parece.
Seria exagero dizer que a força dos livros esteja na sua obsolescência. Exagero, mas não absurdo. Isto porque seu capital simbólico lhes permite até prescindir de leitores, pelo menos a médio prazo. Por isso, acredito, vão sobreviver. Não havendo quem os leia, haverá quem os escreva.
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