sábado, 25 de julho de 2009

SOBRE A EFICÁCIA DO SABONETE

Já vamos para o meio do inverno. Aos poucos, as lembranças da Flip se apagam. Uma das últimas que me restam é da tarde do domingo, dia 5. Foi quando o professor e ensaísta pernambucano Edson Nery da Fonseca, de 87 anos, houve por bem desvelar um dos mistérios da literatura brasileira: a questão do efeito residual do sabonete Araxá.

O facto remonta à primavera de 1931. O poeta Manuel Bandeira passeava pelas ruas de Teresópolis quando viu três belas garotas estampadas num reclame. Isso lhe deu o mote para um poema famoso: "Oh, as três mulheres do sabonete Araxá às quatro horas da tarde! / O meu reino pelas três mulheres do sabonete Araxá!"

Até aí morreu Neves. Sabe-se que Bandeira era mulherengo. Mas por que desejaria locupletar-se do perfume dessas moças exatamente às quatro da tarde? Como praticante do verso livre, tinha todo o direito de deixar a questão em aberto. E não poderia ser às cinco? Às três e meia? Eis a questão.

Encasquetado com isso, Fonseca expôs sua dúvida ao próprio Bandeira. Os dois se conheceram no Rio, em meados da década de 1940. O poeta vivia no bairro do Castelo. Seu apartamento no Edifício São Miguel, além de garçonnière, era também ponto de encontro do pessoal mais jovem que o admirava. Ali Fonseca ficou sabendo por que a Balada das três mulheres do sabonete Araxá estipula com precisão as tais quatro horas da tarde.

Nesse horário, segundo Bandeira, uma mulher que tomou banho no início da manhã apresenta o mais perfeito equilíbrio entre o perfume do sabonete, que arrefece, e os eflúvios naturais femininos, que emergem. Trata-se, por assim dizer, de um equinócio erótico. Quatro horas da tarde, portanto, seria o momento ideal para um cara exigente levar a cabo
(como diríamos?) o intercurso sexual com uma dama.

Hontem, como hoje, esse é um assunto da mais alta relevância. Digo mais: já é hora de se refazer o estudo de Bandeira com os recursos mais avançados da cosmética. Assim se poderia verificar se o supracitado equinócio erótico se mantém às quatro da tarde ou já sofreu certa defasagem. Para dar início às experiências práticas, seria de bom alvitre o Estado decretar a siesta espanhola da uma às cinco. Assim, todos os seus servos, e não apenas os congressistas, poderiam testar a eficácia de todos os sabonetes, e não apenas o Araxá.

3 comentários:

Anônimo disse...

Precisão Cirúrgica. Faltou apenas dizer que nesta hora uma restia de luz insiste em adentrar na escuridão do quarto pelas frestas da veneziana. Ah! soubessem disso todos que insistem em extender a boa mesa, noite a dentro, se livrariam de tantas justificativas e desculpas pelos insucessos.
Genial!
Lando,julho de 2009.

Anônimo disse...

As quatro da tarde é magico...magico porque depois vem o entardecer...que tbm é magico... e a magica se faz...

Anônimo disse...

Do preciso equinócio de odores do Bandeira à suspensão de qualquer artifício ou mesmo banho, ordenado pelo Napoleão a sua Josefina nos retornos das batalhas, fica claro que o que sempre comandou mesmo a festa é a imaginação.
abraço
Antonio