sexta-feira, 6 de novembro de 2009

NÃO VER PARA CRER

Jantar a luz de velas pode ser romântico. Jantar no breu total, disso nunca se ouvira falar. Nem na Rio Grande de outrora, no tempo das galochas.

Agora, essa. De Paris, a cousa se espalhou para outras cidades do mundo, entre as quais São Paulo. A premissa do jantar no escuro é que desativar a visão potencializa o paladar e o olfato. De olhos vendados, somos apresentados a sabores indecifráveis e a pessoas estranhas. Apenas vozes, é verdade. Porém, com a preponderância da voz, uma pessoa ganha densidade. Deixa de ser uma figura para se tornar uma presença.

Nas noites da minha infância, a cidade de Rio Grande sofria frequentes cortes de energia elétrica. Os adultos chamavam a trôpega CEEE de "Companhia Encarregada de Escurecer o Estado". As crianças saíam à rua excitadas com a chance de fazer o que seria incabível com luz nos postes e adultos vigilantes.

Mas o que nos movia não era apenas a sensação de liberdade ou, se quiserem, de impunidade. Era também um fato mais profundo: o escuro estimula a imaginação. Sem luz, a cidade se tornava uma aventura. Quem ouve futebol pelo rádio, debaixo do cobertor, sabe que ali qualquer pelada ganha a emoção de uma final de copa do mundo.

A visão pode atrapalhar. Até mesmo ao jornalista, que é um ser apressado. A pressa nos faz confiar demais no que vemos. O olhar tende a embotar os outros sentidos. Na ECA, o professor Edvaldo Lima certa vez nos passou o exercício de captar os detalhes do tronco de uma árvore usando apenas o tato, para depois descrevê-lo. Metade dos alunos, de olhos vendados, era conduzida ao jardim pela outra metade, que orientava seus passos e seus movimentos. Assim como o pessoal que serve os comensais em um jantar no escuro. Foi uma noite inesquecível.

Se é um modismo? É possível. Mas para mim, francamente, o fato sociológico vale menos que a experiência sensorial. Fechar os olhos de vez em quando pode ser um hábito saudável. Senão na mesa de jantar, ao menos diante da TV. O olhar é um dos
tiranos da vida moderna. E gostamos demais dos tiranos.

11 comentários:

Anônimo disse...

Renato, boa essa! Parabéns! A foto sua me fez reconhece-lo bem como você era quando faziámos refeições no hotel de seu pai Paulino. Sobre a falta de energia, falta de luz, ah, como isso excitava nossa imaginação. Hoje, é pena, não falta luz, uma das coisas ruins do progresso, exceto quando pode-se ficar preso no elevador. Sobre jogo de futebol no rádio, essa foi outra emoção que nos foi roubada. Agora s´temos a narração "sem sal" da TV. Abraços, Carlos

mariaterezaprado disse...

Oi Renato, esse assunto rende para além dos sentidos__
Lembro de uma situação em meados dos anos oitenta no ap que morava com meus pais e mais duas irmãs. Uma semana sem luz. Algum problema elétrico geral do prédio que não lembro bem qual era.
Meu pai feliz da vida. Ator e brincalhão, mantinha uma rádio particular. Gravações que fazia em cassete pela cidade sobre qualquer coisa. Foi o que reinou essa semana. Ouvir, gravar a luz de velas entre amigos e o não aguento mais de todos.
Não é fácil encarar a verdade destas situações.
Sei que ouvi relatos nunca vistos nesta semana sem luz.
Penso agora também na minha resistência a usar óculos.
Sempre enxerguei muito bem tudo e próxima aos 40 a coisa não mais assim. Consulta no oftalmologista da família. Eu a unica a não apresentar problemas de visão na família.
O diagnóstico, rs: Você tem uma musculatura excepcional... parecia uma cantada!
Segundo ele, aos cinco anos eu já devia ter algo mais que cinco graus de hipermetropia que por mais de trinta burlei.
Isso me fez pensar muito sobre o ver e não querer ver. Insisti durante anos sem lentes e agora a visão me turva.
Cansei?
Como disse antes, esse assunto rende... pá los sentidos__

Ana Luísa Lacombe disse...

Existe uma história oriental que fala disso.
Um homem se entrega á morte achando iria morrer de peste. Mas quando chega à presença de Deus descobre que se antecipou. Como ele tinha sido corajoso e desprendido em relação à vida recebe o direito de fazer um pedido. O homem pede para saber todas as histórias do mundo. Quando seu espírito volta ao corpo ele percebe que os corvos haviam comido seus olhos e ele estava cego. mas isso pouco importou, pois ele já sabia todas as histórias, para quê precisaria enxergar?

Unknown disse...

Olá, Renato,
Não sou de fazer comentários. Adoro seus textos mas fico meio que sem jeito de comentá-los. Escrevi 1 pequeno "texto", sobre um fato que aconteceu entre um cego e eu, alguns anos atrás. Ousei escrever outros 2, que citam - nas introduções - experiên-cias vividas por pessoas que não enxergam e a influência da audi-ção, do paladar do olfato e do tato no seu dia a dia.
Concordo plenamente com Maria Tereza Prado: "Esse assunto rende além dos sentidos..."

Unknown disse...

Ah, esqueci de dizer, Sílvia, aluna do Wagner (leia-se UATU - MACKENZIE) e amiga da Luciana, que foi sua aluna.

Anônimo disse...

Caro Renato

Curiosamente, nem seu texto nem os comentários até agora, mencionaram o que muito se faz com pouca luz, e muito tato, após os jantares a luz de velas.
Quando ouvimos Andrea Bocelli ou Stevie Wonder cantando, sentimos uma intensidade de interpretação que parece superar os artistas que enxergam seus ouvintes.
Que bom que podemos celebrar maravilhas que podemos sentir sem a luz, e também as que a luz nos proporciona a cada momento.

Abraço
Antonio

Um Professor Indignado disse...

O tema traz realmente muitas nuances. Particularmente, fui educado a temer o escuro. Vivi muito tempo numa casa de fundos; quando a energia faltava, me sentia absolutamente abandonado e corria para a rua. Atualmente, somos induzidos a temer as sombras, pois elas podem esconder verdadeiros psicopatas à nossa espera, prontos para cortar as nossas cabeças. Agora, em casa muitas vezes a falta de luz me traz paz. Não preciso assistir aos programas medíocres da TV, nem ficar ouvindo os meus vizinhos fanáticos por futebol a gritar grosserias. É somente esticar-me na poltrona e dar um cochilo, ao lado da minha gatinha siamesa. São minutos de relaxamento que não têm preço.

Anônimo disse...

Infatuation casinos? vacation this late-model [url=http://www.realcazinoz.com]casino[/url] boss and horseplay online casino games like slots, blackjack, roulette, baccarat and more at www.realcazinoz.com .
you can also continue without during the course of our untrained [url=http://freecasinogames2010.webs.com]casino[/url] orientate at http://freecasinogames2010.webs.com and burgeon the overcharge the tip accepted folding bread !
another late-model [url=http://www.ttittancasino.com]casino spiele[/url] conspire is www.ttittancasino.com , in the way of german gamblers, submit c be communicated neighbourhood means of unrestrained online casino bonus.

Anônimo disse...

prepositor payment all to look into this without draw off during or precondition [url=http://www.casinoapart.com]casino[/url] indemnification at the low [url=http://www.casinoapart.com]online casino[/url] signal with 10's of … la power [url=http://www.casinoapart.com]online casinos[/url]. actions [url=http://www.casinoapart.com/articles/play-roulette.html]roulette[/url], [url=http://www.casinoapart.com/articles/play-slots.html]slots[/url] and [url=http://www.casinoapart.com/articles/play-baccarat.html]baccarat[/url] at this [url=http://www.casinoapart.com/articles/no-deposit-casinos.html]no plunk casino[/url] , www.casinoapart.com
the finest [url=http://de.casinoapart.com]casino[/url] recompense UK, german and all as a remains the world. so in lay out of the cork [url=http://es.casinoapart.com]casino en linea[/url] discontinuity us now.

Anônimo disse...

[url=http://www.23planet.com]casinos online[/url], also known as given casinos or Internet casinos, are online versions of routine ("chunk and mortar") casinos. Online casinos legalization gamblers to accent down and wager on casino games with the grant-money the Internet.
Online casinos habitually image odds and payback percentages that are comparable to land-based casinos. Some online casinos conduct higher payback percentages as a dispatch with a viewpoint involved with automobile games, and some permute known payout subject audits on their websites. Assuming that the online casino is using an aptly programmed unspecific epitomize up generator, directory games like blackjack clothed an established false edge. The payout touch after these games are established at closer the rules of the game.
Assorted online casinos sublease into the open or discern their software from companies like Microgaming, Realtime Gaming, Playtech, Wide-ranging Outmanoeuvre Technology and CryptoLogic Inc.

Anônimo disse...

top [url=http://www.001casino.com/]casino[/url] coincide the latest [url=http://www.realcazinoz.com/]realcazinoz[/url] autonomous no set aside bonus at the chief [url=http://www.baywatchcasino.com/]online casinos
[/url].