sábado, 28 de julho de 2007

A ERA DO FILHO ÚNICO

Passei uns dias em uma cidade cuja população é a de não mais de dois ou três quarteirões de São Paulo. Fiquei na casa de um casal de amigos. Eles têm um único filho, de quatro anos.

Numa manhã chuvosa apareceu uma van com nove colegas de escola para brincar com ele. Nas férias costumam fazer esse rodízio, um dia na casa de cada um. Grande idéia, pensei. Pena que não a tivessem tido naquelas nossas tardes de inverno do sul. A professora, que veio na van, informou:
< Todos eles são filhos únicos.
> Os nove?

Pois é: os nove. Dez, com o anfitrião. Eu sabia que a tendência ao filho único é um vento que sopra da China, varre a Europa e chega às capitais brasileiras. Conheço muita gente que só tem um, aliás como eu (ou assim espero, pois não conto com lobistas para me custear os gastos nos bastidores). Mas cala-te, boca! Basta dizer que, até ver a van chegar, eu não imaginava que um modelo minimalista de família estivesse em voga também no interior do país.

Limitei-me ao espanto. Já não tenho o receio de antes em relação ao filho único. No passado, ele enfrentava duas formas de solidão. Uma em casa, por não ter aliados no desafio de fazer face ao mundo dos adultos. Outra, fora, por ser visto como exceção à regra.

Este último desconforto já não existe, uma vez que o filho único deixou de ser avis rara. Quanto à solidão doméstica, bem, de repente pode chegar uma van com nove crianças. No tempo das galochas, tínhamos de ficar sozinhos em casa vendo pingos de chuva escorrer no vidro da janela.

Ser filho único tem vantagens e desvantagens. Não cabe lastimar nem enaltecer. Porém o fenômeno se torna inquietante se o associamos à tendência atual de os jovens saírem de casa cada vez mais tarde. Há nisso um fator econômico e outro cultural: para eles, hoje, morar sozinho é menos importante do que foi para nós. Recusam um ritual de passagem. Isto, sim, me preocupa.

Surge um modo de convivência familiar muito diferente do que tivemos até hoje. Vislumbro um homem adulto, com nome “no mercado”, que continua comendo à noite o prato de comida que um de seus pais, idoso, foi esquentar no microondas. Dessa vez, a van não vai chegar.

7 comentários:

Nei Duclós disse...

Renato, parabéns pela beleza do novo formato. E pelo texto, que nos traz novamente tua arguta visão de fatos que escapam das "pautas" recorrentes. Lamento muito não ter ido ao nosso bate papo, mas este inverno gelado, com pestes variadas, me imobilizou bastante no norte da ilha. Mas não faltarão novas oportunidades. Grande abraço.

Rosah disse...

Renato, citando meu genro:"se filho único fosse bom, todos teriam mais de um."Rebato dizendo que eu tenho três:uma única primogênita, um único filho do sexo masculino e uma única filha caçula.Penso que para os pais mais atentos, todos os filhos são únicos, assim como cada um de nós também o somos......
Grande beijo e adorei o novo formato.

Anônimo disse...

O bom desta nova tendência de filho único é que está acabando o preconceito. Tenho 26 anos e sou filha única. Desde nova sempre carreguei nas costas que eu era: mimada e solitária. Não sou nem uma coisa nem outra. Como você mesmo disse no texto, ser filha única tem vantagens e desvantagens assim como ter vários irmãos. Deus me livre de ser a mais velha!!! Já viu o peso que eles carregm nas costas? Têm que dá exemplo aos outros irmãos!!! Fico feliz que ser filho único não é mais tão anormal. Beijocas Flavia (Turma C JL SP)

Unknown disse...

Oi Modernell!

Adorei seu texto e o novo formato do blog!
Quanto ao tema "filho único"...Não sou mãe, mas pelo que noto ao observar as novas famílias, os tempos mudam e se torna cada vez mais difícil dedicar tempo às crianças, ter condições de bancá-los pelos 18 anos (pelo menos) seguintes ao nascimento com um bom plano saúde, boas escolas, cursos, lazer...tudo isso e muito mais custa muito caro e acho mais proveitoso ter apenas um filho com boas condições de vida do que dois ou três que sejam privados das coisas básicas.

Um super beijo!

Unknown disse...

É: ninguém quer fugir de casa, fazer revoluções por aí -- sejam quais forem. Mas o capitalismo, que ganhou tantas dessas crianças, triunfará comendo-lhes a mente, senso crítico e vontades a troco de um emêbiêi e do título cidadãos do mercado.

Anônimo disse...

Sou mãe de filho único e vejo como meu filho de 8 anos se sente sozinho, às vezes somos egoístas, pensamos em ter um filho só para "darmos de tudo", porém tenho certeza que meu filho desejaria muito trocar seus brinquedos, computador, etc. pela companhia de um irmão. Pois ele deseja desde os 5 anos ter um irmão. NÃO deixe seu filho sem a experiência maravilhosa de ter irmãos.

OBS:estou tentanto engravidar a 2 anos e não consigo, estou fazendo tratamento.
Bjs
Cátia

Anônimo disse...

Não existe nada melhor, nem pior que ser filho único; têm suas vantagens e suas desvantagens. Sendo egoísta, vc não tem de dividar nada c/ninguém, nem o amor e a atenção dos pais, porém não tem com quem conversar, brincar ou até brigar. Não tem irmão mais velho tomando conta de vc e não tem irmão menor pra tomar conta. Qdo quer aparecer, só dá vc, mas qdo quer se esconder, não consegue. Tem tudo que os pais podem dar, mas tb todas as responsabilidades. Se dá alegrias, é exemplo, se dá dissabores, a casa cai em lamúrias. Todo filho único queria ter um irmão, mas adora ser mimado, mesmo que não dê o braço a torcer. Como filha única, às vezes gosto, às vezes, não. Como tudo na vida, ser filho único tb tem dois lados, o importante é saber conviver bem com eles. Um abraço.