domingo, 16 de agosto de 2009

LEMBRANÇAS DA TIA MICHELINA

A gripe espanhola matou milhões. Tia Michelina não morreu, mas ficou surda. Zero. Nada mais ouviu depois. Mas ao contrair o vírus, imagino, pode ter ouvido do médico estas sábias palavras:
< Repouso e canja de galinha.

A canja, prato predileto de sua majestade, o imperador Pedro II,
como remédio contra a gripe não foi inventado por minha tia, ao contrário do que parece, nem pela tia de ninguém. Os médicos é que passaram a receitá-la quando viram que nem o quinino era capaz de enfrentar o vírus da gripe espanhola, cujo sobrinho agora nos atormenta.

Hontem como oje, o doutor deve ter sempre algo a nos dizer, ainda que seja um disparate. O que não pode é calar. Na semana passada, a Carta Capital falou das incertezas das autoridades diante da pandemia de gripe suína: "A autonomia dada aos médicos parece, portanto, uma forma de livrá-los de uma cobrança posterior. Ninguém quer ser acusado de provocar uma morte por negligência. O melhor, para os médicos, é poder receitar algo, nem que seja um placebo".

Cada um tem sua receita para prevenir ou combater a gripe: alho, limão, gengibre, cachaça, mel, um monte de coisas. Só a canja é consensual. Um amigo meu que se gripava a três por quatro resolveu o problema quando se habituou a tomar banho frio. Segui seu exemplo, durante um tempo, e deu certo. Naquele ano, não me gripei.

Tomar banho frio é que nem comer peixe cru: apavorante de início, gratificante depois. Trata-se de um hábito que aumenta a nossa resistência física e também nossa autoestima, como ato de heroísmo. Se não recomendo a todos, é para não ser apedrejado na rua.

Soluções caseiras são inviáveis, em grande escala, porque se baseiam no bom senso. O banho frio jamais vai emplacar no Brasil porque
representaria enorme economia energética. Além disso, ameaçaria os interesses da indústria farmacêutica, que vive a nos empurrar tranqueiras contra a gripe.

Para piorar, uma elevação no padrão imunológico nos tornaria menos dependentes do médico. No fundo, queremos uma figura de avental branco para nos receitar uns compimidos coloridos, quem sabe uma injeção. Qualquer coisa
, menos banho frio. Nossa verdadeira enfermidade é querer que alguém tome decisões por nós. Alguém que saiba preparar uma canja. Como a tia Michelina, por exemplo.

9 comentários:

Adélia disse...

Caro amigo Renato: a canja me transporta à infância. Não com prazer, com horror. Naquela época as galinhas eram abatidas em casa,
e o espetáculo era de dar inveja ao Jack... Para a canja, uma torcida básica do pescoço resolvia. Porém, se o objetivo era um molho pardo, o sacrifício assumia requintes de crueldade, que até hoje me dão pesadelos. A canja pode ter curado minhas gripes, mas provocou-me traumas incuráveis. Vou aderir ao banho frio como homenagem ao holocausto das "penosas".
Um carinhoso abraço
Adélia Dias Baptista

se.shira disse...

Olá, Renato

Nada como uma boa canja de galinha caipira, dessas que a gente pega no próprio quintal e prepara com os temperos da horta.

Quando morei no Mato Grosso, diziam que galinha d'angola era boa pra curar gripe.

Coincidência ou não, a verdade é que quando a gente está com gripe e toma uma deliciosa canja de galinha, tudo parece ficar melhor.

Abraços
Setsuko

Marcelo disse...

Renato,

Estou te perseguindo no Twitter!

Marcelo disse...

Você mudou de e-mail?

Rosah disse...

Renato querido,
com o friozinho,abaixo de zero, que anda fazendo por aqui, o banho frio não rende....
Já a canja de galinha....ah! que coisa boa....
Tenho uma teoria, de que canja é mais (muito mais) do que uma sopa.
Canja é carinho, é colo, é chamego...
Canja de galinha é bom demaiiiiissss....pra tudo!

Unknown disse...

Renato, ia dizer que tenho uma irmã, a caçula, que costuma dizer que canja é carinho.Qual não foi minha surpresa quando me deparei com o comentário dela aí...Sem dúvida carinho é um remédio muito eficaz para todos os males. Quem não quer? Até Leila Diniz registrou essa receita! Quanto ao banho frio, já tenho minhas dúvidas, é uma verdadeira tortura. Pode ser que um dia eu me atreva a enfrentar esse paliativo. Abraço.

Anônimo disse...

Caro Renato
Como desta vez o seu ensaio, estilo e elegância à parte, tomou ares de utilidade pública, venho opinar sobre o torturante banho frio no inverno. Tenho, como você, experiência de sucesso com este método, mas para quem não tem o costume, o risco de resfriado é enorme, agravando o problema. A dica no inverno é tomar o banho na temperatura confortável mais baixa possível, e ao final, tomar a ducha fria rápida, iniciando pela cabeça. Se demorar demais, o corpo resfria. Se for no limite certo, o corpo esquenta em seguida e se fortalece.
Experimentem! É saudável como uma canja...
Abraço
Antonio

Um Professor Indignado disse...

Com o clima do jeito que está, frio, calor, chuva, tempestade, aquecimento global, secura, inundação, tudo ao mesmo tempo, não existem receitas, novas e antigas, que resistam. O ideal mesmo é fortalecermos as nossas defesas, investirmos em prevenção. Mas, o homem moderno se sente o verdadeiro super-homem, sem limites, pois dominou a Natureza e escravizou os demais animais. E vai se extinguindo aos poucos; talvez mais uns 1000 anos de sobrevivência. E, se for para levar a gripe suína a sério mesmo, deveríamos suspender todas as atividades que congreguem massas de pessoas. O metrô de São Paulo, hoje, estava particularmente infernal. Agora, quem terá peito de suspender, por exemplo, os jogos de futebol?

Adeline disse...

É como dar pirulito pra criança quando ela vai ao pediatra com dor de garganta por causa de uma simples inflamação.
Pelo menos minhas tias pensam que simpatia e igreja são solução pra TUDO! rárárá

Até mais, professor! :)