domingo, 25 de outubro de 2009

DAS RELAÇÕES MODERNAS

Não é novidade que as relações humanas estão mudando bem rápido. Que essas mudanças sejam para melhor ou para pior, isso já é por conta do freguês. Ou do leitor.

Um conhecido meu, no Sul, tem uma filha adolescente, loira e muito bonita, que arrumou seu primeiro namorado firme. O pai só conhecia o rapaz de passagem, s
ocialmente, como se diz. Mas uma noite chegou em casa e encontrou um silêncio fora do habitual, instável, suspeito, diferente daquele de quando se está sozinho. Percebeu que a filha estava trancada no quarto. Havia algo estranho no ar. Olhou para a mesa da sala e, estupefacto, deparou com um capacete.

Sim, um capacete. Elemento estranho à ordem da casa. Até aquele momento, claro. Pois o pai logo percebeu que ia ter de engolir aquele capacete. Claro que poderia, em vez disso, enfiá-lo na cabeça e invadir o quarto da filha, como faria um capitão da tropa de choque. Mas já não estamos no século XX.

Contemplar um imprevisto capacete de motoqueiro dentro da própria casa permite a um cristão supor que a juventude, oje como hontem, tem a cabeça oca. Mais realista, no entanto, é aceitar que a invasão bárbara já aconteceu. Ali está o elmo, sobre a mesa. E a porta do quarto, fechada, informa que a filhota prefere a fibra de um jovem guerreiro à sabedoria grisalha do papai.

Menos inquietante, mas também surpreendente, é o que um amigo de São Paulo me contou. Seu grande barato, nos últimos tempos, era contar histórias à neta de 3 anos. Mas a nora se mudou para Paris, levando a menina. O ritual das histórias parecia uma página virada na relação entre o avô e a neta.

Aí entrou o Skype para respaldar a tradição. Meu amigo me contou, empolgado, que fizera a neta dormir
(em Paris) lendo para ela (em São Paulo) um livrinho de histórias e mostrando cada página pela câmera. Tudo como dantes no quartel de Abrantes. Antes de dormir, a menina pediu para ver o cachorro do avô. O labrador marrom também entrou na história. Suponho que a saudade que essa menina possa vir a sentir do avô deva ser bem diferente daquilo que entendemos por saudade.

Esses dois episódios acabaram por me convencer de que estamos, de facto, no século XXI. Até duas semanas atrás, eu tinha dúvidas.

12 comentários:

ReginaL.Diniz disse...

Muito legal!! Supimpa... Beleza... não sei como falam os jovens de menos de 30 hoje em dia.. mas eu falo legal...

Adorei o texto! Novos tempos e novos aprendizados! Vamos que vamos...tirar o melhor do melhor sempre!

bjs
Regina

Unknown disse...

Renato, o texto é mesmo supimpa como diria a leitora Regina, mas confesso que tenho tentado me adaptar às novidades decorrentes do século XXI, na maioria das vezes continuo no XX, custo a me reconhecer como obsoleta, o que, na verdade, sou. Grande abraço.

Anônimo disse...

Maravilha, poética demais, tocante, singela e delicada a estória 2; Vêm os avanços tecnológicos, o mundo é cada vez mais aquela tal aldeia global, mas ainda há espaço para a magia do vovô que conta estórias a uma netinha. Carlos Carrion

Anônimo disse...

Caro Renato
Acrescento ao seu acervo de episódios da nova era pais & filhos,o caso de uma amiga,que deparou recentemente com o desconhecido novo namorado da sua filha, enrolado numa toalha, tomando café da manhã na cozinha da sua casa. O argumento da filha foi: Você preferiria que eu fosse para um motel?
Eu, como muitos outros pais de garotas, despreparados para estes tempos de "abertura", preferiria para os pombinhos nesta hora alternativas impublicáveis.
Como daqui pra frente as mudanças de comportamento deverão ser cada vez mais desafiadoras, só nos resta a paciência.
Interessante como um bom texto como o seu fica mais engraçado quando fala só dos outros.
Abraço
Antonio

Guilherme Reed disse...

Grande Modernell e caros comentaristas,

não nos esqueçamos que a geração dos 80 e dos 90 é filha da geração dos 40 e dos 50 que fizeram a revolução comportamental dos 60 e dos 70, revolução essa que serve, digamos assim, de modelo e de prólogo para o que se vive hoje em dia. Ninguém mandou vocês ouvirem Elvis e tomarem pílula contra a vontade dos seus pais...agora é aguentar o tranco!!!
E que venha a geraçãos dos 00 e seus aparelhinhos eletrônicos!!

Anônimo disse...

Com saudades, voltei a reler este Blog ou blogue, enfim...
Ainda gosto de ler...
Quando descubro pessoas que ainda escrevem como tu.
Na verdade, meu caros sobrinhos diriam isto tranquilamente, entre os termos velho e cara, de maneira banal.
Mas os tempos são de século 21, já que agora até o XX e o XXI serão dispensados da nossa escrita...
E não me pergunte em que texto li, pois ainda estou com um problema de excesso de informações, bem vindos por este processo digital...
Beijos,
MIRIAM

Isabel Vieira disse...

Querido amigo Renato,
continuo sua leitora à distância, como antes, só que agora pelo blog, mais contemporâneo. Aliás, você tocou num assunto bem contemporâneo, esse da Família Online. Faço parte da geração dos avós de computador. Acabo de escrever um livrinho para o meu neto de 3 anos, um americaninho fofíssimo, chamado "Vovó mora no computador". Quando ele me viu ao vivo, pela primeira vez, no aeroporto em NY, pôs as mãozinhas na cabeça e disse, espantadíssimo: VOVÓ???!!! I CAN´T BELIEVE IT!!! Pelo jeito, minha Coleção Família Online vai ter outros títulos, pois a vovó aqui tem 4 netos de computador: dois nos EUA, uma na Austrália e uma em Floripa. Novos tempos...
Abração e saudades,
Isabel

Um Professor Indignado disse...

Eu somente queria saber uma coisa. Com tanta tecnologia disponível, a cada dia com novidades (uma delas é que teremos logo, logo, robôs fabricados à nossa imagem, para fazer companhia e provavelmente sexo), por que continuamos tão infelizes, frequentemente? Gente correndo aos psicólogos, pedindo licença de saúde, reclamando de assédio moral, protestando em jornais, etc. Eu tento acompanhar as tendências, até no twitter já entrei, mas desconfio e muito que estamos sendo engolidos pelo novo Capitalismo. Posso ser obsoleto, mas ainda prefiro um bom abraço, de uma mulher saudável, real, ou de uma criança de corpo presente, ou de ler um bom livro que possa segurar nas mãos, etc. Neste momento, sinto uma brutal saudade de uma das minhas filhas e ela morando em Osasco, a 45 minutos de casa, indo de trem. Não suportaria uma distância maior que essa.

Um Professor Indignado disse...

Complementando. Nos relacionamentos, não creio em novidades. Sempre existirão os casais transgressores. Minha filha mesmo: um dia foi morar com um sujeito e depois de um ano de convivência resolveram registrar a relação, em cartório.

Um Professor Indignado disse...

Eu somente queria saber uma coisa. Com tanta tecnologia disponível, a cada dia com novidades (uma delas é que teremos logo, logo, robôs fabricados à nossa imagem, para fazer companhia e provavelmente sexo), por que continuamos tão infelizes, frequentemente? Gente correndo aos psicólogos, pedindo licença de saúde, reclamando de assédio moral, protestando em jornais, etc. Eu tento acompanhar as tendências, até no twitter já entrei, mas desconfio e muito que estamos sendo engolidos pelo novo Capitalismo. Posso ser obsoleto, mas ainda prefiro um bom abraço, de uma mulher saudável, real, ou de uma criança de corpo presente, ou de ler um bom livro que possa segurar nas mãos, etc. Neste momento, sinto uma brutal saudade de uma das minhas filhas e ela morando em Osasco, a 45 minutos de casa, indo de trem. Não suportaria uma distância maior que essa.

Unknown disse...

Adorei o comentário de UM PROFESSOR INDIGNADO, endosso todas a palavras dele. Caro Professor, parabéns por ter dito o que eu não consegui.

Camila Tardin disse...

Olá Renato,
Você não me conhece e eu não te conhecia até descobrir seu blog. Gostei muito dos seus textos. Este, em especial, achei muito interessante.
Ou a gente se adapta a essa modernidade ou...?
Felicidades.
Camila Tardin