quarta-feira, 13 de julho de 2011

NOSSA MURALHA DA CHINA


 Vou para seis anos sem carro. Minha vida melhorou muito, mas não tenho a ilusão de dar mais do que uma contribuição ínfima, simbólica, para arrefecer esse caldeirão do inferno que é o trânsito de São Paulo. Fora isso, só posso oferecer algum palpite pé-quebrado na área do urbanismo ficcional, categoria talvez cabível na próxima Flip, considerando que o homenageado será um fazendeiro do ar.

Domingo passado, em Paraty, saí otimista de uma mesa intitulada Tour dos Trópicos. O tema era urbanismo sustentável. O músico escocês David Byrne, ex-líder do Talking Heads e autor de Diários de bicicleta, exaltou sua experiência de ciclista em Nova York e outras cidades do mundo. Mas quem arrebatou a plateia, com um discurso sereno, consistente, realista, foi o engenheiro e sociólogo Eduardo A. Vasconcellos, especialista em transporte urbano

Segundo ele, apenas 15% da frota de 4 milhões de veículos da cidade de São Paulo (600 mil) bastam para criar o caos que conhecemos bem. (O dobro, imagino, seria um tsunâmi como o que estourou os reatores de Fukushima). Se a situação é crítica, Vasconcelos considera possível, como diz, virar o jogo no segundo tempo. Isto porque, pela primeira vez, as classes média e alta de São Paulo estariam se mostrando dispostas a encarar um assunto que até ontem era um tabu: abrir mão do carro. 

Voltei de Paraty pensando em urbanismo, não em literatura. Ou seria ainda ficção supor que, em vez de demolir (como se pretende, a um custo astronômico) uma via elevada de 3,4 quilômetros de extensão, o medonho "Minhocão", cujo nome oficial, aliás, desde 1971 homenageia um dos próceres da ditadura militar, melhor seria transformá-lo num parque suspenso com uma ciclovia e talvez até um aerotrem? 

Um projeto desses, em São Paulo, iria acelerar o processo de revitalização do centro e turbinar o mercado imobiliário. Fora o ganho de visibilidade na época da copa. Com um jardim suspenso, linear, um longo tapete verde sobre uma espécie de minimuralha da China, a cidade surpreenderia o mundo ao tirar da cartola uma solução mais ecológica e inventiva do que essa obviedade de construir estádios. Isso, sim, a meu ver, seria virar o jogo no segundo tempo.

12 comentários:

EriKa disse...

Renato,
Que bela contribuição para São Paulo.
Parabéns pelo texto.

Ricardo Gomes disse...

Seria tão lindo, inteligente e humano que eu duvido que seja possível! É esperar demais dos que deveriam levar essa ideia avante!

Carlos Carrion Torres disse...

EXCELENTE IDEIA, Renato, parabéns, lidere uma boa campanha! Abraços, Carrion

Bea Correa disse...

Pode fazer uma petição que eu assino
embaixo!

Anônimo disse...

Renato, você mexeu num dos delicados conflitos de interesses da cidade.
O medonho “minhocão” foi concebido como via expressa de conexão viária entre algumas regiões importantes da cidade, entre tantas outras que sempre sonharam ser expressamente conectadas. Muito bonito no papel. Daí, se construiu um medonho teto sobre outrora elegantes avenidas, que viraram, ao nível das vias originais, um extenso porão, que atraiu uma atividade anaeróbica, adversa à luz e ao oxigênio de todos os tipos.
Já os moradores dos andares mais acima da rua, foram presenteados com uma louca procissão de carros e ônibus, despejando seu barulho e sua fumaça, nos primeiros anos, 24 horas do dia, e depois, humanitariamente, até às 22 horas. O resultado, só quem habitou ou frequentou a região, pode descrever.
Por isso, um extenso jardim, com passeios, ciclovias e outros recursos de lazer, traria à região e à cidade um enorme benefício. Isto, é claro, se os urbanistas conseguirem equacionar a qualidade de vida no nível das ruas abaixo, o que não parece tão fácil.
Mas, criatividade e competência nos grandes desafios não faltam no Brasil. Às vezes, são atropeladas pelos famigerados interesses escusos, mas temos que acreditar no futuro, onde ideias como a sua, que só visam o bem de todos, precisam se concretizar.
Abraço
Antonio

Blogger disse...

Vou aderir à sua ideia,Renato. Chega de caos! Adorei esse texto e o anterior, Profano e Sagrado.
Abraços.

Um Professor Indignado disse...

Sonhos podem virar realidade. Mas, creio que o assunto é mais profundo do que sabemos. Quanto lobby não deve ser efetuado pelas montadoras, para manter seu status econômico? Nenhum governo, nos últimos 50 anos, teve a coragem de desafiá-las. São grandes empregadoras, elegem políticos, sustentam boa parte da economia. Assim, somos massacrados diariamente com anúncios de divulgação e venda de automóveis. Para muitos, possuir um carro é o maior símbolo de status pessoal. Neste momento, creio ser difícil que muitos passem a utilizar bicicletas. Quanto ao famigerado Minhocão, parece que a Prefeitura pretende demoli-lo e construir um grande túnel sob a avenida. Outra obra-monstro pelo visto. Para alguém rolará dinheiro.

Anônimo disse...

Caro amigo Renato - considero genial essa idéia de transformar o minhocão num jardim suspenso.Penso que também haveria aprovação unânime daqueles que moram nos desvãos embaixo do dito cujo.
Abraço
Adélia Dias Baptista

Carlos Carrion Torres disse...

Gostei muito desse seu "Diários de Motocicleta". A propósito, vou logo comprar seu livro... Abraços, Carrion
PS - dê uma olhado no meu pouquíssimo Blog sobre linguística http://omniglotbrasil.wordpress.com/

Carlos Carrion Torres disse...

Renato, parabéns por esse seu "Diários de Bicicleta", muito bom! A propósito, vou comprar seu livro logo, logo. Dê umas olhada pelo meu "quase nunca" lido Blog sobre linguìstica - http://omniglotbrasil.wordpress.com/

Carlos Carrion Torres disse...

Renato, parabéns por esse seu "Diários de Bicicleta", muito bom! A propósito, vou comprar seu livro logo, logo. Dê umas olhada pelo meu "quase nunca" lido Blog sobre linguìstica - http://omniglotbrasil.wordpress.com/

Carlos Carrion Torres disse...

Renato, parabéns por esse seu "Diários de Bicicleta", muito bom! A propósito, vou comprar seu livro logo, logo. Dê umas olhada pelo meu "quase nunca" lido Blog sobre linguìstica - http://omniglotbrasil.wordpress.com/