sábado, 20 de agosto de 2011

DA ARTE DE ENTREGAR A RAPADURA

Em sua última entrevista, quatro horas antes de ser assassinado, John Lennon falou de forma auspiciosa sobre o que chamou de feminização da sociedade. Talvez não tivesse sido tão otimista se vivesse para ver a Inglaterra sob o tacão de Margaret Thatcher. 

Mas Lennon não tem culpa alguma. Naquela época, dezembro de 1980, todos nós víamos na ascensão das mulheres um sopro de vida na agenda do mundo. Na verdade, ainda penso assim. Com reservas. Explico-me. Em apenas três décadas, não ficou claro se as relações de trabalho se tornaram mais saudáveis com a justa proporção de mulheres. 

Nas redações onde trabalhei, no passado, conheci ambientes femininos tão ácidos e belicosos quanto pode ser, por exemplo, um terreiro de briga de galos. Se os tomasse como referência, tenderia a pensar que a feminização da sociedade seria, quando muito, trocar seis por meia dúzia. Mas prefiro não pensar besteiras.

Ontem visitei uma grande empresa jornalística. Soube, com satisfação, que tanto nas redações quanto na cúpula a maior parte dos cargos decisórios é hoje ocupada por mulheres. Foi uma surpresa, mas não deveria ter sido. Há tempos percebo em minhas turmas da faculdade uma declinante proporção de rapazes. Já nem chega a 20%. Acho que o jornalismo se tornará uma profissão feminina, como no passado era a enfermagem.

Permitam-me expor minha tese de fundo de quintal. Lembremos que, desde o tempo das cavernas, as mulheres é que ensinavam aos filhos tudo o que eles precisavam saber, à exceção da caça. Pois bem, como no mundo moderno a educação tornou-se função da mídia, elas invadem esse território para resgatar o que sempre lhes pertenceu ao longo da história. 

Em outras palavras, os usurpadores fomos nós, não elas. Assim sendo, acho melhor entregar a rapadura. Que elas sejam felizes e não se estressem muito. Não se estressarão: as mulheres sabem cuidar da sala de visitas. Quanto a nós, bem, vamos todos para o fundo do quintal. Ótimo lugar para se viver a vida. Elas mal sabem o que estão perdendo.  

9 comentários:

Carlos Carrion Torres disse...

Passei pras minha filhas (uma das quais vai se formar já-já em jornalismo, a outra é psicóloga) e pro meu filho. Eles 3 me acham machista, não mereço ser considerado assim. Em todo caso... Carrion

Romeu-Sérgio disse...

Requer testosterona pra escrever essa crônica, Renato. abr,

geraldo roberto da silva disse...

Grande Renato
Já havia vindo aqui antes e, por algumas dessas circunstâncias do destino, não havia comentado ainda. Quero te dizer que gosto muito desse novo formato e que seus textos continuam sendo um prazer de leitura.
Abraço grande

Celso disse...

Santa ingenuidade em relação a educação tornar-se função da mídia. Que mídia é essa que deixou há muito de informar? Apenas seduz, agride e manipula. Ela desinteressou-se da realidade fervilhante, para focar apenas o lado polêmico e chocante.Só a parte morta e apodrecida da realidade é transmitida por essa mídia. Espero que as mulheres consigam transformar esta situação.

Anônimo disse...

Caro Renato
Belo e intrigante texto.
As mulheres se destacam porque vão à luta com mais determinação, ainda motivadas por ter de mostrar aos homens que não têm nada a lhes dever. Quanto aos filhos, zumbis da mídia, o futuro dirá.
Abraço
Antonio

Déborah de paula disse...

não quero rapadura nenhuma, quero ir brincar com os meninos no quintal. beijos, Renato!

Guilherme Reed disse...

Renato,
o que vai rolar de interessante no quintal para os homens?

Um Professor Indignado disse...

A questão é mais séria do que parece. Nós homens tivemos a nossa chance, quando fomos politicamente dominantes, de criar um mundo mais justo, mais equilibrado, com oportunidades para todos. Tornamos as mulheres, em grande parte, seres infelizes, limitadas à cozinha e à sala de estar. Fico muito feliz ao vê-las ocupando espaços de poder. No entanto, falta uma solução para a equação. Homens e mulheres estão se dedicando a suas carreiras e os filhos, quando existem, são criados pela sociedade. Faltou a necessária contrapartida: jornadas de trabalho reduzidas para todos. Assim, poderíamos planejar melhor o crescimento populacional e a educação das crianças. Amo minhas duas filhas e não consigo considerar minha vida sem elas.

Geraldo Hasse disse...

Renato, saludos. De minha parte, já entreguei a rapadura há muito tempo. Mas meu quintal é tão pequeno que não tem fundo. Rapadura e fundo-de-quintal são metáforas para uma situação irresolvida. Voltando ao Lennon, o que é a Yoko Ono tinha que as ocidentais não...?