Um amigo pergunta o que leva alguém a manter um blogue. Para começar, a vaidade. Como o aspartame, ela está presente em tudo, de forma oculta ou explícita.
Porém, no meu caso, a razão principal é outra. Delicio-me até hoje com a possibilidade de publicar por conta própria, de forma instantânea. Na época em que escrevia livros, vi meus originais amargarem longos anos de gaveta. Nunca me foi fácil conseguir editores, que de resto se revelaram mais adversários do que aliados nessa empreitada tortuosa, talvez insana, de levar um texto aos olhos do leitor.
Num blogue, é vapt-vupt. Não sou um blogueiro comme il faut, que interage com os leitores e bota lenha na fogueira. Gostaria de sê-lo, porém mal tenho tempo para perpetrar estas crônicas quinzenais. Espanta-me constatar que já produzi 54, contando com esta.
A propósito de uma outra, Morin e a China, publicada em outubro, Geraldo Hasse me cobrava: “Acho bom tu explicares melhor o que significa a frase 'o individualismo gera dentro de si uma espécie de nostalgia humanitária, e vice-versa”. Ela é mesmo mandrake, admito. Não me agrada turvar as águas do rio para que elas pareçam profundas. Como redator, é cair para a Segundona. Tentarei explicar-me.
Acho que povos e indivíduos, por lucidez ou tédio, se alternam entre fases voltadas para um ideal coletivo ou a uma fixação no próprio umbigo. No primeiro caso, o foco pode ser a justiça social, a sobrevivência ou o esforço para virar uma página da história. No segundo caso, a preocupação com o lucro, os bens materiais e o prazer imediato falam mais alto.
O Oriente vive hoje um delírio consumista, e dane-se o resto. Em contrapartida, entre nós, alguns valores ascéticos e coletivistas da contracultura ressurgem nas pautas das corporações. Em parte por oportunismo, claro, mas também porque o senso comum já sabe aquilo que antes só os hippies sabiam: do jeito que está, a vaca vai pro brejo.
Não creio que essa alternância de sintonia se deva apenas a ameaças globais. Para ela também contribui a provinciana lembrança (real ou fictícia, pouco importa, mas sempre inspiradora) de um tempo em que éramos todos menos cínicos e mais felizes.
Isto posto, o blogue entra em recesso até depois do carnaval. Boa virada de ano a todos. Em 2008 teremos o centenário de Guimarães Rosa. Desde já, muitas rosas a nós todos.
7 comentários:
Bom, vou deixar as rosas pro ano que vem... ou a rosa secundária com perfume doce, passando por linhas ou desalinhos.
Mas se a antiga frase deixou má idéia de individualismo com outro significado, o de agora é o de dar bom ano, boas festas e ótimo retorno.
Quem sabe onde estaremos então!
Grande beijo e forte abraço.
Miriam
Agradeço as rosas, que como boa individualista, egocêntrica e nostálgica recebo como exclusivas e pessoais. Vou sentir falta do blogue nestas noites polares, mas suponho que vc tenha ótimos e agradáveis motivos para o recesso. De minha parte quero te deixar dois presentes para estes meses de ausência. A dica de um site para aliviar, em parte, esta angustia editorial que muitos de nós bem conhecem: http://www.lulu.com
E uma frase que estranhei não ser tua. Tem licença para emprestar ao Geraldo Hesse, mas que devolva...
"Il marinaio spiegò le vele al vento, ma il vento non capì".
Boa viagem, ou seja lá o que for.
Orietta
"O individualismo gera dentro de si uma espécie de nostalgia humanitária, e vice-versa". Será, Renato? A palavra individualismo, por si só, já define o tipo. O eu somente, o ser sozinho, venha nós o vosso reina, seja feita minha vontade. Amém... Daí dizer que o Individualismo gera nostalgia é arrumar pra cabeça. Geraldo Hasse tem razão em pedir explicações. Será mesmo que o individualista pensa na questão humanitária, o todo. Acredito que não. Tiziano deixa isso muito claro no Um adivinho me disse.... A busca do dinheiro, do material, que são o desejo de cada indivíduo - não dividual; indiviso, indivisível - definição do Houaiss. Nunca buscam a felicidade, o bem estar, o coletivo. Daí vem o velhinho de 100anos e diz que nada tem importância. "Importante é a tranquilidade, é o otismo". É meu, só rosas pra todos nós. Bom Ano Novo.
...e tenha muitas festas supimpas neste fim de ano. E tenha um novo ano supimpa também!!!
Renato, amigo velho, por qual motivo farás um recesso tão longo?
Tu me fizeste deliciosa companhia nestes quase dois anos vividos em Campo Grande (MS), mas eu nunca te retribuí sequer com um comentário. Scusa me, pero... eu estava em fase de redescoberta interior. Do "campo" voltei para a cidade renovada, e continuo totalmente contrária ao individualismo -- gostei, Geraldo Hasse, do teu pitaco! Individualismo para mim, Renato, é conversar com os outros somente através de mails e blogues e recados e orkuts. Sou a favor da internet, claro, mas muito mais a favor do contato humano esse sim supera qualquer nostalgia humanitária.
Por último: não a-cre-di-to que tu terminaste Jornalismo na FAAP em 1975... Eu terminei em 74!!! Como tu foste meu foca e a gente não se lembra da cara um do outro???!!!??
Bacci, Lica (Alice Sampaio)
Renato, obrigada por todas as rosas recebidas durante 2007. Desejamos que novos botões voltem a aparecer em teu jardim, para que possamos curtir seus espinhos também. VALEU!!!!!!!!!!!
Renato,
Estou na metade de seu livro, Sonata da última cidade. Encantado com sua linguagem e seu talento narrativo!
Gostaria de manter contato!
Abraços!
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